Em Key West

Hemingway, foi uma lenda de autor. Nasceu com inteligência e com um poder de expressão excepcional. Na escrita foi prático, pouco dado a devaneios. Gostava de escrever á mão, frases curtas num estilo tenso com poucas emoções e pouca adjectivação. Escreveu sobre o amor e sobre a morte. Sobre a guerra e a violência. A vida parada nunca foi o seu tema nem o tema dos seus romances. Falou no que altera no homem a perspectiva de normalidade. Suicidou-se em Julho de 1961, duas balas de caçadeira rebentaram-lhe os miolos. A cara, bem parecida tinha o maxilar quadrado, a testa larga com uma ruga de expressão vincada atravessada ao meio, queixo forte, bigode ou barba farta. Cuidou da aparência até á altura em que a pele ficou curtida pelo Sol de Key West e de Cuba, envelhecida por uma vida de aventuras, uma vida de romance, de doenças e de lesões. De paranoias, de álcool. Quando morreu, diz-se que tropeçava em tristeza e tinha deixado de escrever.

Hemimgway tinha uma personalidade borderline e narcísica como todos os bons escritores , os livros que escreveu tiveram influencia até hoje e os escritores sabem o que devem a este americano. Li “ Adeus ás Armas”  um dos romances de Key West, que nos  deu a história trágica da paixão do tenente Henry e da enfermeira Catherine Barkley durante a Primeira Guerra. Uma história de sofrimento, lealdade e deserção contada sem redundâncias. Uma história sobre a verdade humana e as possibilidades desta nunca ser traída, tomada do ponto de vista das acções das personagens mais do que do seu interior. Neste verdadeiro poema de amor, Henry e Catherine nunca foram falsos, até ao fim, independentemente de tudo.

Papa para os que lhe foram especialmente chegados quando vivia em Havana, bebia mojitos na Bodeguita e Daiquiris na Floredita, dois bares que se transformaram famosos  num negocio de nostalgias, até hoje. Há uns anos, quando estive em Cuba peregrinei  até ao hotel “ Ambos Mundos” para entrar no quarto de Hemingway. Lembro-me que havia uma mesa com uma das suas máquinas de escrever, a cama tinha uma colcha branca. Nas paredes Hemimgway parecia vivo nos quadros a pescar espadartes que saltavam das águas cor de esmeralda, safira , ou turquesa das  ilhas Key West. Nas  estantes haviam livros de outros autores que coexistiam com a sua memória.

Antes de Havana a sua  casa foi  Key West, lugar de Verão sem fim, na Florida. Uma ilha de casas em tom pastel, um pequeno paraíso conhecido pelos recifes de coral, pelo qual trocou Paris. Aqui,  tal  como em Cuba havia Rum. Muito Rum. Coktails Papa Dobles, como ficaram conhecidos , feitos com rum branco, limas, toranja e gotas de marrasquinho. Charutos. Livrarias. Artesanato.  Praias de areia branca.  Telheiros com barcos de pesca. Era um sítio de artistas exilados e de quem aprecia a solidão mas não aprecia o Inverno, como Hemingway. Um abrigo onde desembarcou por volta de 1928. A Key west, nessa altura só se chegava de barco e consta que ainda hoje as estradas não são mais do que umas estreitas línguas de asfalto.

 

Naquele Verão a morte veio muito cedo para Hemingway. Deixou uma herança de centenas de livros anotados á mão, diários e manuscritos originais, barcos, quadros. Amigos. Leitores. As mulheres foram outro dos bens do escritor, Hemingway nunca se quis ver livre da sua senha de lascívia. Como disse numa das suas frades certeiras que preparou para o discurso que não leu em Estocolmo quando lhe deram o nobel em 1954 ; “ … o escritor faz o trabalho sozinho e, se for suficientemente bom na escrita, deve enfrentar a eternidade , ou a falta dela , todos os dias “ . Foi o que fez.

 

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